quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

oscar 2011: 127 hours



Depois de muitos meses sem escrever, mudar de mestrado e cruzar o Atlântico duas vezes, finalmente me instalei em um novo país e resolvi fazer um novo post pelo simples motivo de que nas últimas semanas assisti a coisas sensacionais! Estamos em plena “red carpet season” e é nessa época que os estúdios lançam os filmes que consideram ser seus golden tickets para levar algumas estatuetas. Bom para os fãs de cinema, que podem se deliciar com coisas bem bacanas em tela. Os indicados ao Oscar foram anunciados sem grandes surpresas ontem e, coincidentemente no mesmo dia tive o privilégio de ver uma palestra com Simon Beaufoy, o roteirista de “Ou Tudo ou Nada”, “Quem Quer Ser Um Milionário” e do filme sobre qual escrevo hoje, “127 Hours”. Beaufoy viu na tarde do mesmo dia seu nome ser anunciado como um dos candidatos a levar o prêmio de melhor roteiro original.

“127 Hours”, é uma obra bem difícil de enquadrar como um gênero específico. O filme é baseado no livro “Between a Rock and a Hard Place”, do americano Aaron Ralston que relata a história real da qual foi protagonista: durante uma caminhada por um parque nacional desértico em Utah, nos EUA, Aaron sofreu um acidente e acabou tendo a mão prensada por uma rocha, tendo ficado por mais de 5 dias preso dentro de um cânion, isolado. Não é spoiler contar que ele conseguiu escapar, já que a história é de fato real e foi contada em detalhes pelo próprio Aaron, mas vale fazer suspense sobre como ele o faz; a que sacrifícios tem que se submeter para salvar a própria a vida.

O filme é o aguardado projeto seguinte de Danny Boyle, diretor inglês superpremiado pelo overrated “Quem Quer Ser Um Milionário”, que levou os grandes prêmios no Oscar em 2009. Boyle é claramente um diretor indie e usou o status e influência que o Oscar lhe trouxe para conseguir viabilizar este projeto, um filme que dificilmente se enquadraria nos planos de algum grande estúdio, entre outros, por um grande motivo: seu protagonista passa praticamente o filme todo sozinho em cena, contracenando consigo mesmo.

Boyle tem soluções interessantes para burlar o isolamento de Aaron na trama. Ele está fisicamente sozinho, sim, mas mergulhamos a todo instante na mente do personagem. Ecoam lembranças, memórias e até projeções de quem ele foi, é e, se conseguir sair daquela situação, deseja ser. O diretor usa todos os truques frenético-visuais que aprendeu com seus filmes anteriores (“Trainspoting”, “A Praia” e “Slamdog Millionaire” gritam na tela!) como artífico para ilustrar o exagerado espírito aventureiro do jovem. Os primeiros 20 minutos de filme são como um grande especial de esportes radicais de algum canal de TV a cabo: split screens, slow e fast motion usados aos montes, câmeras frenéticas e muita adrenalina. Passada essa etapa e instalado o grande conflito do filme, Boyle passa a usar seus truques para invadir a mente do protagonista e ilustrar em tela o processo de amadurecimento psíquico e espiritual que o permitiram sobreviver àquela situação.

James Franco interpreta Aaron Raltson.
É prazeroso assistir. As coisas estão no lugar certo e a eficiente fotografia de Enrique Chediak e Anthony Dod Mantle funciona. Mas sente-se a presença de Boyle um pouco demais. Não que as pirotequinias dele não sejam eficazes; são. Mas fica a incômoda sensação de mais do mesmo. Já vimos muitos dos artifícios empregados nos outros trabalhos do diretor e a coisa acaba soando como se ele estivesse no automático. O filme tem, no entanto, um grande trunfo: James Franco.

O longa é nitidamente de Franco. Construir uma narrativa que se apóia integralmente em seu protagonista não é fácil e Boyle teve sensibilidade apurada ao escolher seu Aaron e confiar plenamente nele para levar a história. Franco imprime em tela o arco dramático de seu personagem com muita competência e carrega uma ironia, um senso de humor absolutamente necessários para compor este personagem. A trajetória de Aaron é, na verdade, seu amadurecimento. Passa de um jovem arrogantemente inconsequente, a um homem que valoriza as coisas que tem ao seu redor e que busca forças para conquistar as coisas que ainda não tem. James Franco se diverte como o Aaron inicial, aquele que é o “dono do mundo”, o jovem confiante o suficiente para embarcar nesta viagem sozinho. A cena em que entrevista a si mesmo, como se estivesse em um programa de auditório, falando para uma câmera portátil que carrega é genial – é neste momento que revela para a platéia que não contou a ninguém onde estava indo e revela a si mesmo que aquilo muito provavelmente vai lhe custar a sua vida.

É verdade que Danny Boyle (re)utiliza vários dos elementos que já nos mostrou em seus filmes anteriores e que isso pessoalmente me distanciou do filme. Mas é preciso dar o braço a torcer e dizer que esses artifícios de fato funcionam em tela. O filme não se torna monótono em nenhum momento e o diretor consegue imprimir bastante aflição à trama, em especial na aguardada (e ao mesmo tempo supertemida) cena do auto-sacrifício a que Aaron tem que se submeter para escapar daquela situação. Em tempos de inacabáveis “Jogos Mortais”, que extrapolam o uso da violência gráfica e nos dão uma perversa aula de anatomia humana, Boyle nos entrega uma sequência brilhante; explícita na medida certa. Vemos o mínimo e o máximo necessário da carnificina e o resto é trabalho da montagem precisa de Jon Harris, do trabalho de som e da interpretação impecável de James Franco. Difícil não levar às mãos ao rosto ou fincar os dedos na poltrona do cinema.

Franco foi indicado ao prêmio de melhor ator e Danny Boyle correu por fora: não levou indicação de melhor diretor, mas assina o roteiro com Beaufoy e por isso pode levar outro Oscar para casa. Acho bem difícil que o filme ganhe o prêmio de melhor filme, pois briga com produções de peso (sobre as quais vou tentar escrever nos próximos dias). Fica aqui o meu desejo de que Danny Boyle explore outras linguagens em seus próximos filmes. Não há duvidas que é um diretor muito competente e seria bem interessante vê-lo explorar novas maneiras de contar suas histórias.

Indicações ao OSCAR:
Melhor Filme
Melhor Ator – James Franco
Melhor Roteiro Adaptado
Melhor Montagem
Melhor Trilha Sonora Original
Melhor Música - "If I Rise", A.R. Rahman, Rollo Armstrong, Dido




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